Entrevista a Carlos Fonseca, ForestWISE, Portugal Chama

8 de Março de 2023

1. Porque foi criado o ForestWISE – Laboratório Colaborativo para a Gestão Integrada da Floresta e do Fogo?

O ForestWISE, à semelhança de outras entidades como a AGIF, foi criado após os catastróficos incêndios de 2017, vindo dar resposta às lacunas identificadas pela Comissão Técnica Independente criada no seio da Assembleia da República, nomeadamente as relacionadas com a apropriação e incorporação de conhecimento científico nos diversos planos de intervenção do SGIFR. A Resolução de Conselho de Ministros n.º 159/2017, de 30 de outubro, sustentou a criação deste CoLAB e, por interesse mútuo da indústria, das empresas, da academia e da administração pública, numa iniciativa sem precedentes no nosso país, nasceu o ForestWISE que tem como missão fazer (co)investigação aplicada, inovar e transferir conhecimento e tecnologia para aumentar a competitividade do setor florestal em Portugal, prevenir os grandes fogos rurais e reduzir as suas consequências negativas.

2. As reformas levadas a cabo nos últimos anos tiveram como objetivo mudar o paradigma da forma como encaramos e enfrentamos o fenómeno dos incêndios rurais. De que forma o ForestWISE contribui para isso?

O ForestWISE, para além de ter um papel central na co(geração) de conhecimento e da sua transferência, bem como de tecnologia e de inovação para o SGIFR, tem a capacidade de, através da sua equipa multidisciplinar, monitorizar e acrescentar valor ao conhecimento gerado nos centros de investigação. Contudo, estamos cientes de que a mudança de paradigma é gradual, de médio-longo prazo, não se baseando apenas em questões estruturais e funcionais do sistema, mas também em aspetos culturais e humanos que normalmente são mais difíceis de alterar. Daí que uma das nossas linhas de trabalho seja ‘Pessoas e Políticas’, precisamente para incorporar esta componente no sistema que, estamos em crer, ser fulcral para a resolução do fenómeno dos grandes incêndios rurais. Apesar de sentirmos que há uma enorme expectativa sobre o que o ForestWISE poderá fazer, será necessário tempo e persistência nos investimentos públicos e privados, bem alinhados estrategicamente, para que o impacto no país se faça de facto sentir.

3. O que é que diferencia o ForestWISE de outras iniciativas?

O ForestWISE é uma associação privada sem fins lucrativos, constituída por uma estrutura associativa diversificada, congregando os principais agentes privados, públicos e académicos do nosso país. Desde logo as mais relevantes empresas dos setores da floresta e da energia em Portugal (Altri Florestal, Amorim Florestal, E-Redes, DS Smith Paper Viana, REN, Sonae Arauco e a The Navigator Company), com interesses comuns na gestão e valorização dos espaços florestais, instituições do Sistema Científico e Tecnológico Nacional (SCTN), como as Universidades de Aveiro, Coimbra, Évora, Lisboa (Instituto Superior de Agronomia), Trás os-Montes e Alto Douro e o INESC TEC, e duas entidades públicas de grande relevância nos temas do fogo e das florestas, desde logo a Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais (AGIF) e o Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV) às quais se irá juntar, em breve, o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA).

Para além desta forte estrutura associativa, o ForestWISE possui uma equipa executiva multidisciplinar constituída por mais de vinte Investigadores e gestores de projetos, posicionando-se, desde logo, como a entidade de I&D&I nacional com mais competências exclusivamente focadas nas áreas da floresta e do fogo. Ainda assim, importa salientar que a equipa executiva do ForestWISE iniciou a suas funções apenas há dois anos e só agora se está a terminar o processo de recrutamento da equipa de base, bem como a qualificação dos seus recursos humanos, o que não tem sido nada fácil porque o mercado tem absorvido todo o talento disponível. A nossa operação quotidiana tem por base uma Agenda Estratégica de Investigação, Desenvolvimento e Inovação (Agenda de I&D&I), que responde às prioridades e necessidades dos nossos associados, de múltiplos parceiros e do país, apoiando as políticas públicas nacionais nas áreas de competência e de atuação do ForestWISE.

4. Se pudesse escolher um projeto que melhor representasse os objetivos do ForestWISE qual seria?

De entre os projetos que o ForestWISE está envolvido atualmente eu destaco o rePLANT, um projeto coliderado pela The Navigator Company, apoiado pelo Compete/Portugal 2020 e que, para além de incluir todas as linhas de trabalho do ForestWISE que emergiram da agenda de I&D&I, incide em toda a cadeia de valor da floresta, tendo em vista a sua valorização, mas também a sua maior resiliência aos riscos, como os fogos rurais. O rePLANt é um projeto mobilizador, colaborativo, integrando 20 parceiros, e que terá um impacto em todo o ecossistema produtivo e empresarial do setor florestal, melhorando a segurança das populações que vivem em espaços florestais, os sistemas de prevenção e combate aos incêndios, reduzindo as ameaças à biodiversidade e aumentando a resiliência da floresta e das infraestruturas e a competitividade do setor. Como projeto de interesse nacional, o rePLANT destina-se a investigadores, produtores e proprietários florestais, entidades públicas, empresas do setor e ao público em geral, numa vertente de conhecimento geral e de valorização da nossa floresta.

5. Quantos projetos tem o ForestWISE atualmente em desenvolvimento?

Para além do financiamento de base, promovido pelo Portugal 2020 (CCDR-N) e pela FCT, com o acompanhamento da ANI, atualmente o ForestWISE tem 11 projetos em execução, entre projetos competitivos, com financiamento nacional e internacional e prestações de serviços. O volume de projetos que temos atualmente tem contribuído para a sustentabilidade económico-financeira do ForestWISE que assenta num modelo de 1/3 de financiamento público de base, 1/3 de fontes públicas de natureza competitiva, nacional e internacional e 1/3 de receitas próprias por atividades de prestação de serviços com empresas e/ou a administração publica, a nível local, regional nacional ou internacional. Nos dois anos de operação o volume de negócios do ForestWISE aproximou-se dos 4,5 milhões de euros, num total de mais de 25 milhões de euros de investimento em projetos nas áreas das florestas e do fogo. Presentemente o ForestWISE lidera ou colidera grandes consórcios no âmbito do PRR que irão dar um contributo muito significativo para a transformação do setor da floresta em Portugal, incluindo a valorização dos seus produtos, como é o caso da resina natural.

6. Quão importante será para o ForestWISE a cooperação efetiva entre os associados e parceiros que a compõem?

Estou em crer que a chave do sucesso do ForestWISE, enquanto Laboratório Colaborativo, é essa mesmo, a de servir como estrutura de cooperação e de colaboração entre associados de diferentes naturezas, mas com objetivos comuns: o de melhorar a gestão e valorização florestal, à qual está implícita a redução dos riscos, de entre os quais os fogos rurais têm um papel determinante no nosso país. Para além da rede de 15 associados, o ForestWISE agrega uma série de parceiros, com destaque para as entidades do SGIFR (ICNF, GNR, ANEPC, DGT, CCDRs, CIMs, entre outros) e integra redes e consórcios internacionais, dos quais destaco o Copernicus Relays.

Ao longo dos dois últimos anos o ForestWISE tem vindo a assumir-se como uma entidade agregadora e “fazedora de pontes” que, com independência e profissionalismo, tem conseguido dar resposta aos desafios que lhe são lançados, apoiando a construção de políticas públicas nas suas áreas de competência. Ainda assim, temos a perceção de que a construção de uma instituição com empresas, universidades, institutos de I&D e entidades públicas como associadas, num modelo completamente novo, é um desafio permanente, mas gerador de um potencial enorme para o país.

7. Qual é a relevância do fato do ForestWISE estar instalado fora de Lisboa?

O ForestWISE tem um âmbito de atuação nacional, comandada pela procura, pelo que o facto da sua sede estar localizada no norte do país, no Campus da UTAD, uma das mais relevantes entidades nacionais nas áreas da floresta e do fogo, pode ser considerado estratégico, com todas as vantagens e desafios que isso acarreta. Atualmente o ForestWISE possui uma delegação no Porto e é possível que venha a ter outras delegações espalhadas pelo país. Não tenho dúvidas que o ForestWISE irá crescer significativamente no curto-médio prazo, podendo esse crescimento, que se pretende gradual e sustentado, passar por novas localizações, onde os nossos associados têm implementação e, acima de tudo, onde haja projetos relevantes para a floresta e fogo que careçam das competências do nosso CoLAB.

In, Portugal Chama, 8 Março 2023